A tendência de adoção de automóveis elétricos em Portugal está em franco crescimento, impulsionada pelo aumento significativo dos preços dos combustíveis fósseis, pelas alterações legislativas que apontam para o caminho das emissões zero e pela própria consciência ambiental dos condutores.

É cada vez mais óbvio que o próximo passo da mobilidade será dado no ambiente dos automóveis 100% elétricos, havendo a meta de se atingir em 2030 uma redução significativa das emissões poluentes, traduzindo uma aposta praticamente consensual entre os principais fabricantes de que os veículos sem emissões serão o futuro.

Na sessão de debate do Standvirtual relativo à aceitação dos Veículos Elétricos e o seu papel no mercado nacional até 2030, representantes do Grupo BMW, Grupo Astara e Polestar coincidiram na opinião de que a aposta está feita e que o caminho para a eletrificação é irreversível. Todavia, o progresso na eletrificação terá de ser acompanhado da necessária aposta e investimento de todos os participantes na mobilidade: construtores, governos e consumidores.

Para João Gonzaga, diretor de Vendas e Marketing da BMW, “sendo um assunto relacionado com questões climáticas e com a sustentabilidade da vida em cidade, qualquer meta tem de ser ambiciosa. Todos nós temos consciência de que é preciso haver uma mudança de comportamento e de atitudes para que a tendência que temos vido a ver neste aspeto seja revertida e se atinja a tal meta de redução de 50% nas emissões de CO2 em 2030. É importante também referir que a redução de emissões é relacionada com veículos ligeiros e passageiros mas com todo o segmento dos transportes, é relevante pensar que todos os ‘players’ do segmento dos transportes têm de fazer um trabalho conjunto para de forma global atingir essa meta”.

Já sobre o papel da BMW, Gonzaga explica que a marca está a trabalhar para que se atinja a redução das emissões de forma significativa, adiantando que tem condições para que as vendas de veículos 100% elétricos sejam superiores a 50% já em 2030, atendendo a que, “nos dias de hoje, só a marca BMW tem 17% de vendas de modelos 100% elétricos. Isto lembrando que há dois ou três anos vínhamos de uma percentagem de 3 ou 4%. Tem havido um crescimento exponencial nos elétricos, tem sido feito um caminho e vai continuar a ser feito para que consigamos chegar aos 50% de elétricos em 2030”.

A mesma filosofia de pensamento é partilhada por Francisco Geraldes, CEO da Astara Portugal, que detém marcas como a Kia, Mitsubishi, Aiways ou Maxus, dando o mote para um crescimento sustentado dos elétricos, mas também alertando para os obstáculos ainda pela frente.

“Os construtores começaram há bastante tempo a trabalhar as suas organizações, a preparar os concessionários e os serviços internos para ajudarem o cliente nas suas diferentes opções. Em Portugal, a adesão aos veículos elétrico tem crescido bastante. Há uns anos a resistência era grande, mesmo dentro das nossas organizações, mas de há um ano e meio para cá, essa realidade alterou-se por completo. O consumidor já compreendeu a transição energética e quer participar nela. Quem trabalha no setor também já percebeu e quer participar, quer estar preparado. Mas há vários requisitos para participar nessa transformação, há grandes desafios: o custo de aquisição do veículo, para começar. Em Portugal temos apoios para as empresas, mas não temos para o cliente particular, e a infraestrutura de carregamento – que eu separaria entre a pública e a privada (nos condomínios e empresas) e vemos que quem adere tem um ponto de carregamento em casa”, refere Geraldes.

Oportunidade para as novas marcas

A transição para os automóveis elétricos também se afigura como uma oportunidade para a chegada de novas marcas ao mercado europeu, com Geraldes a explicar que a abertura nas regulamentações europeias possibilitou a entrada de novos ‘players’ na Europa em condições de igualdade.

“A Europa, com as regulamentações que criou ao longo das últimas décadas, fez com que os modelos de combustão interna à venda no continente fossem diferentes dos do resto do mundo, com normas poluentes restritivas – Euro 3, Euro 4, etc. Com a eletrificação, não há isso, a tecnologia que se vende na Europa, China ou Estados Unidos é igual e isso é uma oportunidade. Temos marcas conhecidas europeias a terem a sua produção na China e essa é uma barreira que deixa de existir para todos. Há uma oportunidade para todos – se o farão bem ou mal é outra coisa, mas os construtores que passam para os veículos elétricos também passam a ter outras opções de venda em mercados onde não estavam. Creio que os consumidores só vão ganhar com mais oferta”, argumentou.

Uma das marcas que tirou partido precisamente dessa uniformização tecnológica foi a Polestar, marca premium sueca (pertencente ao grupo chinês Geely) que entrou em Portugal este ano apenas com veículos elétricos. Miguel Pinto, diretor-geral da Polestar Portugal, enaltece o percurso que tem sido feito pela mobilidade elétrica no nosso país e considera que o ambiente de mobilidade elétrica é favorável à Polestar e ao seu posicionamento mais cimeiro.

“Sinto que a Polestar chega numa fase de bastante desenvolvimento, pelo que não sentimos que a ansiedade seja uma barreira na adoção dos nossos produtos. Neste momento, estamos no bom caminho. Qualquer empresa, como a minha que vende elétricos, não sente que venha a existir uma grande dificuldades na adoção desta tecnologia”, referiu Miguel Pinto, que não vê o posicionamento da Polestar como um entrave para o seu crescimento.

“Em primeiro lugar, há uma questão de posicionamento e dentro dessa questão, os preços da Polestar estão bastante contidos e até ligeiramente abaixo dentro daquilo que é a concorrência da marca. Os preços advêm de economias de escala, mas há também uma questão de posicionamento. Temos um veículo premium, de performance e os preços revelam o posicionamento que queremos ter”, argumentou.

Da ‘velha’ condução ao transporte de mercadorias

Vista como uma marca muito dada à ideia do prazer de condução, João Gonzaga, da BMW, garante que “quem gosta de conduzir e tem aquele prazer de condução ao volante pode senti-lo também num elétrico, que atualmente tem performances dignas de um verdadeiro desportivo”, indicou. “A própria BMW M está a apostar na motorização elétrica para os seus futuros desportivos. Em termos de automóvel em si, não há motor que dê melhor resposta do que o motor elétrico, com o binário disponível imediato. Em termos de condução, seja na BMW ou com outra marca qualquer, há um prazer de condução associado ao elétrico. Todos nós temos os nossos gostos e julgo que temos necessidades diferentes: quem gosta de um carro desportivo com motor de combustão vai manter o seu gosto – enquanto puder, até que os regulamentos o impeçam. Mas é uma ótica de utilização diferente. Estamos a caminhar na eletrificação e não há volta a dar. Daqui a sete anos, comprar um carro novo terá de ser elétrico. Em termos de prestações e performance, os modelos de combustão e elétricos estão aptos a combater lado a lado”.

Noutra tipologia de utilização, Francisco Geraldes, aponta ainda para uma outra necessidade, a de acelerar a eletrificação no setor dos veículos de transportes de mercadorias, sobretudo em ambiente urbano.

“Nos veículos comerciais há uma oportunidade enorme. Estamos sempre a dizer que não queremos carros de combustão no meio das cidades, apelamos aos transportes públicos e à mobilidade alternativa para ir à cidade, por isso creio que ninguém quer veículos comerciais de combustão dentro das cidades quando existirem veículos elétricos. Se virmos que o mercado de veículos eletrificados nos modelos de passageiros é de 20%, nos de mercadorias ainda é curta, entre 3 a 4% pelo que tem de crescer”, clarifica.

“A FUSO vai ter modelos 100% elétricos ainda este ano e vimos os clientes muito interessados nesta transformação, até porque muitos clientes para quem trabalham estão também a exigir que os transportes sejam feitos por frotas eletrificadas. Isto traz também um perfil de utilizador diferente. Um cliente particular tem um veículo elétrico que se adapta às suas necessidades, como uma viagem esporádica de longa distância, mas um veículo comercial é mais racional, tem uma utilização e tem de ter uma vantagem no custo. É uma decisão muito mais racional e fácil até certo ponto. Há pouca variedade, mas vai avançar. Há também muitos poucos incentivos comerciais – terá de ser muito mais apoiado”.