As energias renováveis já representam um quarto (26%) da produção mundial de eletricidade, mas as políticas erráticas podem vir a comprometer as metas climáticas impostas pelas Nações Unidas e pela União Europeia. É esta uma das grandes conclusões do relatório anual Renewables Global Status Report (GSR) da associação REN21, recentemente divulgado.

E este foi o ponto de partida para o presidente da Associação Portuguesa das Energias Renováveis (APREN) olhar também para o setor da mobilidade e dos transportes, em particular, um dos “pilares” do Roteiro para a Neutralidade Carbónica, que mais emissões deverá ver reduzidas.

Mas, apesar de tanto entusiasmo à volta da eletrificação do automóvel, o caminho ainda é longo. E os obstáculos a ultrapassar não são apenas no plano tecnológico. Estratégias políticas bem definidas e mudanças comportamentais são também determinantes para atingir a descarbonização da energia em 2050.

 

O relatório da Rede de Energias Renováveis para o Século 21 indica que as renováveis integram somente 3% da energia usada nos transportes. Sabemos no qual é o seu peso em Portugal?

O setor dos transportes contou, em 2017 (últimos dados disponíveis pela DGEG), com uma incorporação renovável de 7,9%, valor este que deverá atingir os 10% em 2020 e 20% em 2030.

 

No setor da mobilidade o que é preciso para dar o grande salto?

As novas tecnologias no setor dos transportes carecem ainda de muitos desenvolvimentos para que possam ser competitivas face às demais. É esperada pois uma redução do preço das baterias, o que terá impacto direto no custo do veículo elétrico. Um ponto ainda questionável consiste no seu peso ambiental, o que urge à criação de soluções para a sua reciclagem. Com a crescente introdução de renováveis, vê-se cada vez mais a necessidade de ajustar a procura à oferta de eletricidade, facto que, no caso dos veículos elétricos só será alcançado com a capacitação e inteligência do carregamento dos veículos, para que este se ajuste à curva de oferta. Os veículos elétricos a hidrogénio podem constituir uma solução interessante para os pesados, mas são necessárias muitas melhorias ao nível da tecnologia, nomeadamente no que respeita à identificação de soluções viáveis ao transporte e armazenamento de hidrogénio. Por fim, são necessários mais progressos ao nível dos biocombustíveis avançados, para que possam também fazer parte integrante da futura frota nacional de viaturas não emissoras de gases com efeito de estufa.

 

E quais os principais entraves para essa transição em Portugal?

Penso que os portugueses estão cada vez mais cientes da importância da transição energética e do impacto dos combustíveis fósseis no ambiente e na saúde humana. Há, contudo, uma série de handicaps à descarbonização dos transportes e podemos olhá-los de três hemisférios distintos. Um deles é a tecnologia, a atual infraestrutura de carregamento é deficitária, sendo fulcral a sua expansão e adequação às necessidades da população. O hemisfério social e económico é outro, dado envolver mudanças comportamentais significativas, não apenas por parte do condutor -, que terá de fazer um planeamento mais detalhado das suas viagens, pelo menos nesta fase de inicial -, mas também no que respeita às novas soluções de mobilidade partilhada, que oferecem um conjunto de opções de transporte principalmente urbano. É ainda importante ressalvar que a escolha de qualquer tecnologia está sempre de mãos dadas com os níveis de conforto, segurança e confiança por parte do cidadão, sendo importante garantir infraestrutura e serviços disponíveis. Por outro lado, os veículos elétricos disponíveis em mercado, são ainda um leque reduzido de modelos e tipicamente mais dispendiosos que os convencionais, o que constitui um bottleneck à sua incorporação nacional. Por fim, é preciso uma estratégia política bem definida, aliada a incentivos, crucial para efetivar esta transição. É fundamental criar incentivos à compra dos veículos, a somar aos atuais incentivos fiscais (não pagamento do IUC), ou mesmo aos descontos aplicados em diversas cidades ao nível do parqueamento. A regulação e as áreas metropolitanas têm também de saber dar resposta aos novos serviços de mobilidade, maximizando estas soluções para melhorar a intermodalidade, tornando assim as cidades mais sustentáveis.

 

Até que ponto taxar o carbono é uma medida eficaz e com efeitos imediatos?

A imposição de taxas de carbono é importante na medida em que torna menos competitivas tecnologias emissoras de CO2, mas nunca será eficaz se o investimento inicial em tecnologias não emissoras permanecer superior às restantes. Isto é uma realidade no caso dos veículos elétricos, para os quais a oferta em mercado ainda é escassa e o seu custo de aquisição é, regra geral, superior aos de combustão interna, para a mesma categoria de veículo.

 

Comparando com outros setores, qual o peso do setor automóvel na transição para as energias renováveis?

Em 2017, os transportes rodoviários emitiram cerca de 17MtCO2, o correspondente a 33% das emissões totais do setor da energia (indústrias energéticas, construção e transportes) para esse mesmo ano, e no bolo total das emissões nacionais (78MtCO2), estes representaram 22%. O seu peso é imenso, e constitui no Roteiro para a Neutralidade Carbónica um dos pilares que mais emissões deverá ver reduzidas para possibilitar a descarbonização da economia até 2050. A incorporação de renováveis nos transportes é a única alternativa à concretização deste objetivo e pode, no setor automóvel, advir de diferentes formas, seja pela incorporação de biocombustíveis avançados (100% biocombustível), de veículos elétricos (com bateria) na frota ou de veículos a hidrogénio.

 

E como se posiciona Portugal em relação à mobilidade elétrica no contexto da União Europeia?

Segundo dados do Statista, o market share de novos veículos elétricos registados em Portugal em 2018 foi de 3,5% – 1,9% de veículos totalmente elétricos, e 1,6% de veículos híbridos plug-in. Segundo esta mesma fonte, posicionamo-nos em 6º lugar na Europa, sendo que em primeiro lugar, está, obviamente, a Noruega, com um market share de 48,3%.

 

Qual é, ao certo, o mix energético em Portugal?

No que se refere à incorporação de renováveis no consumo final bruto de energia, sabemos que em 2017 este foi de 28,1%, estando o restante repartido pelo petróleo (cerca de 45%), pelo gás natural (cerca de 10%), por eletricidade não renovável (15%), e restante por calor não renovável e outros.

 

 

Texto: Kátia Catulo | Foto: Bruno Lisita/Global Imagens

 

 

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