Os ralis em Portugal e os homens que lhes emprestaram o talento e a emoção estão de parabéns. Como tudo na vida, o Campeonato de Portugal de Ralis teve um começo e é disso que vamos falar nas próximas linhas.
Apesar da data do seu arranque não ser consensual, uma vez que o primeiro campeonato apenas foi oficialmente instituído em 1966, a verdade é que os arquivos da FPAK atribuem a 1956 o início desta competição, logicamente ainda num formato distante daquele que passou a vigorar mais tarde, cabendo a Fernando Stock inaugurar o álbum de ouro.
O primeiro campeonato
A história começou então a escrever-se a meio da década de 50, quando o Automóvel Clube de Portugal, a então Autoridade Desportiva Nacional, instituiu aquele que viria a ser o primeiro Campeonato Nacional de Condutores, com provas de estrada (sob a fórmula de ralis turísticos) e de velocidade, disputadas em circuitos e rampas. Durante estes primeiros anos não houve propriamente a atribuição de um título de Ralis, mas antes o consagrar de Campeões Nacionais Absolutos, por Equipas e também por Grupos (Turismo de Série, Turismo Especial, GT, GT Especial e Sport), já que todos os tipos de carros eram admitidos.
Nesse período, os ralis tinham ainda pouca ou nenhuma exigência competitiva: os automóveis utilizados eram estritamente de série e a velocidade não era ainda um elemento fundamental, na medida em que os participantes deveriam apenas superar o percurso estabelecido a uma determinada média horária. Por norma, entre os 40 e os 50 km/h – tanto quanto a então Direcção-Geral dos Transportes Terrestres autorizava.Mas como estas médias eram relativamente fáceis de cumprir, mesmo para a época, os organizadores sentiram a necessidade de acrescentar uma ou duas provas complementares de perícia (aceleração, marcha-atrás ou slalom) para determinar a classificação daqueles que terminassem a prova de estrada sem penalizações.
Assim, de meros passeios de regularidade, os ralis passaram a ser decididos na estrada, onde já não era possível fazer “tudo a zero”, com a colocação de Controlos Horários consecutivos, a maioria deles com mais quilómetros do que os indicados nas cartas de itinerários, o que tornava as médias impossíveis de cumprir, levando todas as equipas
a penalizar. No fundo, era o figurino europeu da época.
Nasciam os ralis modernos
Usando este artifício legal, estava aberto o caminho para os ralis modernos e para o nascimento das chamadas Provas Especiais de Classificação (vulgo, PEC), solução encontrada pelos organizadores escandinavos no final da década de 50 para fazer face às muitas restrições impostas pelas autoridades locais, quando o aumento do tráfego se tornou evidente e a Europa estava bastante sensível aos problemas de segurança das provas automobilísticas.
Por esse motivo, os clubes apresentaram a possibilidade de realizar ralis em estradas fechadas ao tráfego, somando no final os melhores tempos em cada troço cronometrado, num esquema que foi evoluindo até se chegar à fórmula próxima dos troços cronometrados. Mesmo assim, não foi uma transição pacífica e fácil, pois era necessário mudar as mentalidades dos organizadores e dos próprios pilotos, até aí habituados a ganhar nos piões e travagens das provas complementares. Visionários portugueses Durante largos anos, os ralis portugueses continuaram fiéis a este último modelo, à semelhança do acontecia em Inglaterra, enquanto no resto da Europa
as provas de estrada começavam já a oferecer verdadeira competição.
Mas, graças à visão de Carlos Fonseca (Estrela e Vigorosa Sport) e Heitor de Morais (100 à Hora), os ralis em Portugal viriam também a sofrer uma profunda revolução. O primeiro mostrou o caminho a seguir no seu Rali de Montanha de 1952, enquanto o segundo transformou em definitivo o panorama dos ralis nacionais, a partir da sua Volta a Portugal de 1963. Uma edição que contou ainda com provas de perícia, rampas e circuitos, mas cuja classificação foi já estabelecida nos inúmeros controlos horários espalhados ao longo do percurso. A vitória sorriu a Manuel Gião (Cooper S), apesar de Horácio Macedo ter vencido quase todas as complementares com o seu Ferrari 250 GT.
No ano seguinte, ainda não satisfeito, Heitor de Morais deu outro importante impulso à modernização dos ralis em Portugal, adoptando o figurino escandinavo na XV Volta a Portugal – a primeira prova nacional a utilizar troços cronometrados. Pouco a pouco, outros organizadores seguiram-lhe o exemplo, alargando os ralis nacionais a outras regiões, como Montejunto, Cabreira ou Arganil. Sem ser indiferente a este novo contexto, a Comissão Desportiva Nacional, antecessora da actual Federação Portuguesa de Automobilismo e Karting, decidiu abandonar em definitivo o estilo de provas mistas (ralis, velocidade e provas de regularidade), dividindo o Campeonato Nacional de Condutor Completo, existente desde 1955, em Campeonatos Nacionais de Ralis, Velocidade e Regularidade, a partir de 1966.
Separadas as águas Aprovada esta alteração, que depressa se alargou a outras latitudes, os ralis ganharam uma outra competitividade e popularidade, tendo o Campeonato Nacional se realizado sem interrupção desde então, excepção feita a 1974, ano em que a crise petrolífera mundial impediu a sua efectivação.
Outros tempos
No início da década de 50, as provas de Ralis ganharam um novo significado e nomes como os de Fernando Stock, José Luís Abreu Valente e Horácio Macedo saltaram do anonimato para a ribalta, acompanhando a progressiva popularidade das provas de estrada. Mas, nos tempos em que os ralis eram ainda uma mistura de provas de velocidade, regularidade e perícia, talvez tenha sido Horácio Macedo quem mais se destacou com os seus três títulos (1957, 1961 e 1963). Recordou-nos esses tempos de forma nostálgica: «nessa época, faziam-se muitos amigos no ambiente das corridas e lutava-se com os outros concorrentes somente pelo prazer de ganhar e pelas taças, o que não acontece hoje, em que os ralis são feitos para as marcas vencerem e onde há muito dinheiro envolvido».
Tudo isso numa época em que à excepção do Ferrari 250 GT que Macedo guiou «quase todos os carros que corriam nesse tempo eram os do dia-a-dia». Mas tal como hoje também muitas provas não escapavam a polémicas. Prova disso é a forma curiosa e invulgar como Horácio Macedo terminou a sua carreira. O piloto entregou a sua licença desportiva depois de vencer o Rali Internacional do ACP, ser desclassificado devido à passagem antecipada num controlo de passagem e ser impedido de fazer a apelação à entidade internacional que supervisionava o desporto automóvel, quando outros pilotos que corriam em Mercedes e Alfa Romeo e que estavam nas mesmas circunstâncias, o puderam fazer.
Desportivismo era tónica dominante Mas mudaram-se os tempos e mudaram-se…os nomes dos pilotos. E na segunda parte da década de 60 quem mais deu nas vistas foi mesmo Américo Nunes que, apesar disso, não fez esquecer pilotos como César Torres, Manuel Gião ou Sarmento Rebelo. Para o piloto do Porsche 911, conhecido pela “bomba verde” os quatro títulos alcançados (entre 1967 e 1970) «foram um excelente prémio, mas o que mais se destacava era a forma e o desportivismo que tinham os ralis naquela altura, bem como a camaradagem entre os pilotos», disse numa homenagem que a FPAK lhe fez há 11 anos, ao AutoSport.
Foi então, na década de 90 e nos primeiros anos do novo milénio, chegada a vez de pilotos como Fernando Peres, Adruzilo Lopes, Pedro Matos Chaves, Miguel Campos e Armindo Aráujo – já no advento dos Grupo A, WRC e Produção – inscreverem as páginas do que hoje é conhecido pelo “Nacional de Ralis” ou “Campeoanto de Portugal de Ralis”.
Agora só falta preencher o nome dos campeões do amanhã…
PALMARÉS | |
1956 | Fernando Stock |
1957 | Horácio Macedo |
1958 | José Luís Abreu Valente |
1959 | José Luís Abreu Valente |
1960 | José Manuel Pereira |
1961 | Horácio Macedo |
1962 | José Baptista Dos Santos |
1963 | Horácio Macedo |
1964 | Fernando Basílio Dos Santos |
1965 | César Torres |
1966 | Manuel Gião |
1967 | Américo Nunes |
1968 | Américo Nunes |
1969 | Não houve Campeão Absoluto |
1973 | Não houve Campeão Absoluto |
1974 | Não se realizou |
1975 | Manuel Inácio |
1976 | António Diegues |
1977 | Giovani Salvi |
1978 | Carlos Torres |
1979 | José Pedro Borges |
1980 | Santinho Mendes |
1981 | Santinho Mendes |
1982 | Joaquim Santos |
1983 | Joaquim Santos |
1984 | Joaquim Santos |
1985 | Joaquim Moutinho |
1986 | Joaquim Moutinho |
1987 | Inverno Amaral |
1988 | Carlos Bica |
1989 | Carlos Bica |
1990 | Carlos Bica |
1991 | Carlos Bica |
1992 | Joaquim Santos |
1993 | Jorge Bica |
1994 | Fernando Peres |
1995 | Fernando Peres |
1996 | Fernando Peres |
1997 | Adruzilo Lopes |
1998 | Adruzilo Lopes |
1999 | Pedro Matos Chaves |
2000 | Pedro Matos Chaves |
2001 | Adruzilo Lopes |
2002 | Miguel Campos |
2003 | Armindo Araújo |
2004 | Armindo Araújo |
2005 | Armindo Araújo |
2006 | Armindo Araújo |
2007 | Bruno Magalhães |
2008 | Bruno Magalhães |
2009 | Bruno Magalhães |
2010 | Bernardo Sousa |
2011 | Ricardo Moura |
2012 | Ricardo Moura |
2013 | Ricardo Moura |
2014 | Pedro Meireles |
2015 | José Pedro Fontes |
2016 | José Pedro Fontes |
2017 | Carlos Vieira |
2018 | Armindo Araújo |
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