Nunca se esquece o primeiro automóvel

04/05/2019

O primeiro automóvel é a primeira amostra de autonomia, o nosso bem mais precioso. Qualquer entusiasta consegue perder horas a comentar o quão divertidos eram e quão especiais e avançadas eram as suas características e ao mesmo tempo ignoram completamente as suas falhas gigantescas.

Nas nossas mentes, o primeiro carro torna-se num amigo, num membro da família. No final, acabamos por lhes conceder alguns atributos humanos. Esse fascínio parece loucura, aos olhos de quem está de fora, para essas pessoas é apenas um automóvel velho.

Em vários casos, esse automóvel especial não é especificamente o primeiro carro, mas o que mudou completamente a nossa percepção. Aquele que nos recompensa, se cuidarmos dele, aquele que nos da vontade de sair de casa e simplesmente conduzir. Não importa quantos anos passaram desde essa altura, ainda o vemos através dos olhos daquele jovem entusiasta que se apaixonou por ele. As desculpas que eram usadas no passado, enquanto tentávamos justificar as suas falhas, não mudam, esta tendenciosidade continua bem depois de deixarmos de o conduzir.

No meu caso, o automóvel em questão é um Alfa Romeo 33 1.3. O último Alfa com o motor boxer alimentado por carburadores. É fácil ver que a sua mecânica descende da plataforma do Alfasud, a qual foi partilhada por vários compactos da casa de Arese durante a década de 80. É um utilitário bem à moda italiana, incluindo todas as peculiaridades que vêm com o território.

Gosta de beber, a segunda relação de caixa só pode ser seleccionada facilmente por um condutor que conheça bem as manhas da mesma. No entanto, o comportamento divertido e a sonoridade do motor boxer, fazem com que qualquer condutor ignore as falhas a partir do momento que se senta atrás do volante.

O argumento acerca das vantagens de conduzir um automóvel lento, de forma espirituosa, ganha vida num automóvel deste tipo. É um veículo que obriga a que o condutor trabalhe de forma árdua ao volante. Algumas técnicas de condução, como duplas e ponta-tacão, são essenciais para tirar o máximo proveito da caixa e motor. No entanto, é isto que torna a experiência de condução muito mais gratificante, a meu ver é algo que contribui para o seu charme italiano.

Olhando para trás, acredito que o meu destino, era tornar-me num Alfista. Desde miúdo, que tinha fascínio pelo 164 Super de um vizinho, mas o maior impacto veio na forma do Sprint que a madrinha da minha mãe conduziu diariamente durante 22 anos.

Quando eu tinha onze anos, minha mãe precisava de comprar um carro. Como a internet ainda estava na sua infância, a procura centrava-se em anúncios do jornal. Certo dia na secção de classificados do JN, encontrei o seguinte anúncio: ” Alfa Romeo para venda, Verde Alface, JLL, VE, EP, FC, número de telefone …”. No dia seguinte, após horas a tentar convencer meu pai, fomos ver o carro. Não era verde alface ou um 164 com tinha esperança que fosse, mas sim o 33 que podemos ver nas fotos. Passadas algumas horas, éramos orgulhosos proprietários de outro automóvel italiano. Durante sete anos, foi o meio de transporte da minha mãe, que o conduziu todos os dias sem um único problema. Aos 18 anos, tornei-me no guardião do Alfa.

Como já mencionei em artigos anteriores, conduzi-lo completou minha transformação de interessado para entusiasta afincado. Com o tempo desenvolvi o hábito de sair só para conduzir. Homem e máquina em completa harmonia, é uma das sensações mais maravilhosas do mundo.

O 33 foi meu principal veículo durante três anos, até ao dia que os preços dos combustíveis se tornaram incomportáveis e a necessidade de um automóvel mais económico passou a obrigatória. Isso significava que o pequeno Alfa verde teve de ser encostado.

Apesar de ter sido relegado a deveres de automóvel de fim-de-semana, ainda era bem cuidado. Apenas nos últimos quatro anos tem sido um pouco negligenciado, infelizmente, está a começar a tornar-se evidente. Actualmente, precisa de amortecedores, alguns tubos de borracha, estofar o banco do condutor, uma afinação e revisão geral. Pretendo devolvê-lo de novo à estrada, num futuro próximo.

Estou plenamente ciente de que não é um automóvel valioso ou uma versão com interesse histórico. No entanto, tenho a certeza de que se algum dia conseguir possuir um dos meus automóveis de sonho sempre terei um lugar especial para este pequeno Alfa Romeo 33. Faz parte da pessoa em que me tornei.

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António Almeida / Jornal dos Clássicos

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