Seis municípios avaliados em teste ambiental inovador: como se portaram?

10/11/2018

Dois organismos ligados ao ambiente e uma universidade desenvolveram em seis municípios portugueses um estudo inovador a nível internacional, destinado a avaliar o contributo local para a sustentabilidade do planeta. Como ficaram neste exame Almada, Bragança, Castelo Branco, Guimarães, Lagoa e Vila Nova de Gaia?

A associação ambientalista Zero – Associação Sistema Terrestre Sustentável, a Global Footprint Network (GFN) e a Universidade de Aveiro desenvolveram um projeto de análise à pegada ecológica de seis autarquias.

O projeto em causa recebeu a designação de “Pegada Ecológica dos Municípios Portugueses”, envolvendo seis câmaras municipais: Almada, Bragança, Castelo Branco, Guimarães, Lagoa e Vila Nova de Gaia.

De acordo com o coordenador deste projeto, Paulo Magalhães, da Zero, o projeto assenta em três objetivos gerais:

  • estimar a pegada ecológica e a biocapacidade dos municípios envolvidos (2018);
  • debater com os cidadãos e partes interessadas dos municípios as implicações dos resultados e as opções de mitigação, com o auxílio de calculadoras online da Pegada Ecológica (2019);
  • estudar e propor instrumentos e políticas que reforcem a coesão e equidade territorial com o objetivo de promover a gestão sustentável do território (2020).

“Nos últimos anos, a pegada ecológica tem sido calculada para diversas cidades em todo o mundo, embora o cálculo da biocapacidade nunca tenha sido trabalhado a esta escala territorial”, explica a Zero.

Iniciativa inovadora

Alessandro Galli, diretor do Programa do Mediterrâneo da GFN e coordenador científico deste projeto na GFN, salienta que esta iniciativa é, nesse sentido, “inovadora, em termos nacionais e internacionais, pela forma como integra o cálculo da pegada ecológica com o cálculo da biocapacidade ao nível municipal”.

Segundo este elemento da GFN, “o projeto pretende gerar um forte envolvimento da sociedade civil, sobretudo depois de conhecidos os resultados, e potenciar a promoção de novos instrumentos e políticas públicas que incentivem a redução dos impactes ambientais e o reforço dos serviços prestados pelos ecossistemas destes municípios”.

Vida próspera dentro dos limites do planeta

Ainda no entender de Galli, “para serem resilientes e bem-sucedidos, os municípios precisam de encontrar formas de atuar e de proporcionar uma vida próspera aos seus cidadãos, dentro dos limites do planeta, e para isso é necessário existir informação quantificada capaz de influenciar as tomadas de decisões”.

A “Pegada Ecológica” é uma metodologia reconhecida internacionalmente e desenvolvida pela Global Footprint Network que permite medir o impacto das nossas atividades de consumo nos recursos naturais do planeta.

A metodologia pode ser aplicada a várias escalas, desde um indivíduo, cidade, região, país, até ao planeta Terra, comparando os recursos naturais usados para suportar um determinado estilo de vida com a capacidade dos ecossistemas para gerar esses mesmos recursos.

“É uma importante ferramenta de alerta para as necessárias mudanças de comportamento de consumo das sociedades atuais e para um novo paradigma de efetiva valorização dos serviços prestados pelo ambiente ao Ser Humano”, sublinha Alessandro Galli.

Resultados dos municípios para o Total Nacional

Os resultados, apresentados em cada município por Sara Moreno Pires, professora da Universidade de Aveiro, que coordenou a parte científica do projeto em Portugal, demonstram que os municípios com maior população são também os que mais peso têm no total da Pegada Ecológica de Portugal: Vila Nova de Gaia, Almada e Guimarães.

Já no que diz respeito à biocapacidade, os municípios de Castelo Branco e de Bragança são os que mais contribuem para o total da Biocapacidade portuguesa, com 0,9% e 0,7% respetivamente, o que, de uma certa forma, também reflete a maior dimensão destes territórios face aos restantes em análise.

E per capita que resultados se obtêm?

O estudo levou ainda em conta os valores da Pegada Ecológica e da Biocapacidade nos referidos seis municípios per capita, ou seja, pesando na equação o número de habitantes de cada município.

gha: hectares globais, unidade de área usada para definir a pegada ecológica e a capacidade biológica de nações. Um hectare global significa um hectare de produtividade média mundial para terras e águas produtivas num ano. Biocapacidade, representa a capacidade dos ecossistemas em produzir recursos úteis e absorver os resíduos gerados pelo ser humano.

Nessa perspetiva, a Zero salienta que os resultados mostram que a Pegada Ecológica atinge, em 2016, nos seis municípios analisados, um menor valor per capita na autarquia de Lagoa com 3,25 hectares globais (gha) por pessoa, 17% abaixo da média de um cidadão nacional, ou seja, em média, cada residente de Lagoa precisou de 3.25 gha de área bioprodutiva para suportar o seu estilo de vida nesse ano.

Almada obteve o maior valor per capita da Pegada Ecológica com 4,08 gha, 4% mais elevada do que a média nacional de 3,96 gha.

Por sua vez, a Biocapacidade per capita alcançou o valor menos elevado nos municípios de Vila Nova de Gaia (0,17 gha por pessoa, 85% abaixo da média nacional) e Guimarães (0,19 gha). Os valores que se destacam como positivos são os dos municípios de Bragança e Castelo Branco, com um contributo per capita a corresponder a 2,68 gha e 2,31 gha, respetivamente. A biocapacidade per capita de um português corresponde a 1.28 gha.

O SALDO ENTRE PEGADA ECOLÓGICA
E BIOCAPACIDADE É SEMPRE DEVEDOR
EM TODOS OS MUNICÍPIOS E DEMONSTRA OS DESAFIOS LOCAIS PARA
INVERTER LÓGICAS DE CONSUMO
PREJUDICIAIS AO AMBIENTE

“Estes resultados seguem um padrão semelhante a nível mundial, em que cerca de 130 países se encontram em défice ecológico, dos quais Portugal se inclui, de acordo com o relatório da WWF, Zoological Society of London e da Global Footprint Network”, refere a associação Zero.

A área para sequestro de carbono é a que mais se destaca em todos os municípios, com mais de 50% da componente da Pegada Ecológica, demonstrando a importância de se apostar em políticas de descarbonização da economia. A segunda componente de uso do solo mais importante é a área de cultivo (cerca de 22% a 24%).

Dia da Sobrecarga da Terra

O “Dia da Sobrecarga da Terra” (“Overshoot Day”) simboliza o dia do ano em esgotamos os recursos gerados nesse ano pela biocapacidade do Planeta.

Assim, se toda a população mundial consumisse ao mesmo nível que o consumo médio de cada residente de um destes seis municípios, o dia de sobrecarga seria atingido entre 27 de maio (Almada) e 4 de julho (Lagoa).

Se toda a população mundial tivesse, em média, o mesmo valor de consumo de cada uma das pegadas ecológicas dos seis municípios examinados, o número de planetas Terra que seriam necessários iria variar entre 1,9 planetas (Lagoa) e 2,4 planetas.