Em mais uma demonstração de que os carros não se medem aos palmos, o pequeno Abarth 595 Competizione não dá hipótese ao elegante Abarth 124 Spider que nos remete para uma história gloriosa. Utilizam o mesmo motor sobrealimentado de quatro cilindros, com injeção direta de gasolina e 1368 cc, mas diferentes níveis de preparação deixam o modelo baseado no Fiat 500 em vantagem. São 180 CV contra 170 CV da versão criada sobre o Fiat 124 Spider. Apesar de acusar mais 10 kg na báscula, a vantagem de dez cavalos permite ao 595 Competizione reclamar uma relação peso/potência favorável.
Como o binário é igual (há uma pouco significativa diferença de 500 rpm a favor do 124 Spider), o “pequenote” bate o roadster na prova de arranque. A caixa de cinco longas velocidades ajuda, poupando uma passagem, face à de seis velocidades do 124 Spider. Para além das transmissões, a montagem dos motores também é diferente. No descapotável é longitudinal, com uma estrutura de reforço em alumínio entre a caixa e o diferencial autoblocante traseiro, e no 595 Competizione é transversal. Assenta sobre o eixo dianteiro, que conta, igualmente, com um autoblocante mecânico. Neste caso, o mesmo do 695 Biposto. Isto faz do Competizione o 595 mais próximo da versão especial de corrida do Fiat 500. Não tem a caixa invertida com o H à vista, mas tem ar condicionado, rádio, vidros nas portas e um preço substancialmente inferior. Custa 29 500€. Nem mesmo os 42 000€ do roadster 124 Spider chegam aos 46 000€ do Abarth mais caro.
À frente ou atrás
Atendendo a que têm apenas dois lugares – ok, o 595 pode transportar duas crianças lá atrás… – escapes ruidosos e preços elevados face às correspondentes versões base, estamos perante interpretações muito mais impulsivas do que racionais. Brinquedos de gente grande, apaixonada por desportivos italianos, motores sobrealimentados e dividida apenas na forma como gosta de colocar a potência no chão. Mais do que o tamanho, o preço ou a capota em lona é a tração que distingue os dois Abarth.
É a forma como o carro é puxado ou empurrado que vai definir o comportamento em curva. Por muito eficaz que o autoblocante do 595 Competizione seja a fechar a linha com o acelerador, não tem comparação com o escorregar progressivo da traseira do 124 Spider. É uma questão de gosto e de habilidade. Com tração dianteira e carroçaria compacta, o 595 Competizione é muito mais permissivo que o descapotável. Não tem como desligar a eletrónica mas, mesmo que tivesse, dificilmente se viraria ao condutor.Já o 124 Spider é um tração traseira. Pode não ultrapassar os 200 CV, mas, sem eletrónica, basta o piso molhado ou uma entrada fora de tempo para ter de ir apanhar a traseira. Ainda assim, devido à potência contida, é um roadster mais divertido de conduzir do que perigoso. Acerte-se nas doses de acelerador e volante e o autoblocante ajuda a escorregar de uma curva para a outra sem sobressaltos de maior. Basta manter o turbo cheio, porque sem ele o roadster torna-se demasiado progressivo. Bom para as voltas da cidade ou para descontrair numa qualquer estrada marginal.
Alma italiana
Na serra – e admitimos que o problema possa ser nosso – simplesmente não dá para andar devagar. Na essência, o 124 Spider pode ser um Mazda MX-5, o que não tem nada de errado, pelo contrário, mas o toque da Abarth e o ronco do escape Record Monza transmitem-lhe a alma caraterística dos desportivos italianos. Começa por ter mais 13 cm de plásticos que, com os mesmos 2,31 metros de distância entre eixos, esticam a carroçaria até aos 4,05 metros.
Sob o longo e elegante capot trabalha o conhecido motor 1.4 T-Jet, com 1368 cc, quatro cilindros, turbo e, neste caso, 170 CV. Mais 30 CV que a versão utilizada no Fiat 124 Spider, embora o ganho de binário não exceda os 10 Nm disponíveis 250 rpm mais tarde. Muito dependente do turbo, não mostra grande ânimo abaixo das 3000 rpm. No entanto, com o turbo bem cheio, é rápido a galgar a segunda metade do taquímetro, até ao limite das 6500 rpm.
Competizione
Dos três Abarth 595 utilizáveis no quotidiano, o Competizione é o mais aguerrido. E não é por este ser amarelo que isso se vê logo. Está patente em pormenores como o redimensionamento da entrada de ar dianteira, que melhora a capacidade de arrefecimento em 18%, o extrator traseiro mais pronunciado, a apurar o fluxo aerodinâmico, ou nas novas jantes 7% mais leves e 52% mais eficazes a arrefecer os travões. Por ser o Competizione, os discos de 305 mm são perfurados e mordidos por maxilas Brembo.
No interior há revestimentos exclusivos em Alcantara e carbono, consola central em carbono e novo painel de instrumentos TFT de 7’’ com função Sport. Alcantara, carbono e cabedal convivem de forma harmoniosa no novo volante. A pega é perfeita e o corte na zona inferior faz todo o sentido, porque as bancquets são muito altas, atrapalhando tanto a entrada como o ajuste da posição de condução que, já com os bancos normais, não é fácil de afinar. Dito isto, as bacquets Sabelt com costas em carbono são lindas!
E no entanto, o melhor do 595 Competizione não está à vista. Está no motor 1.4 T-Jet, cujas alterações ao turbo, injetores e gestão eletrónica elevam a potência para os 180 CV. Nos amortecedores Koni de frequência seletiva, que maximizam o contacto com o solo. No autoblocante mecânico do 695 Biposto. E claro, no escape Record Monza que, pela superior intensidade e profundidade dos graves, parece ter sido feito de encomenda.
É uma tentação. Entre a vivacidade do motor, a agilidade dos 3,66 metros de comprimento com 2,30 m de distância entre eixos e a banda sonora do escape, a energia do 595 Competizione é contagiante. É necessária uma boa dose de autocontrolo para não começar a inventar troços de rali no meio do trânsito ou ver parabólicas em todas as rampas de ligação entre vias rápidas e autoestradas. O melhor é procurar estradas secundárias, as mesmas que o 124 Spider andou a varrer com a traseira.
Ao contrário do sugerido pelo acerto firme dos amortecedores, o 595 Competizione não é o suprassumo da interatividade. Contudo, é rápido a entrar em curva e relativamente fácil de provocar, mais com o pedal do meio, entrando a travar, do que com o acelerador. Acertando nas doses de acelerador e travão, e aproveitando a inclinação da estrada, pode rodar como um cubo. Mas, na maior parte das vezes, limita-se a seguir a frente, que tem um elevado nível de aderência.
Puxando a frente para dentro em carga, o autoblocante permite ao 595 Competizione sair disparado das curvas em apenas três rodas, com a traseira interior no ar. Tudo isto se passa no modo Sport que, para além de engrossar a sonoridade do escape, agiliza a resposta do motor, do acelerador e da direção. Limitada a cinco velocidades por motivos de espaço e binário, a caixa tem uma terceira interminável. Mas, ao contrário do 124 Spider, vale a pena explorar os limites da segunda velocidade. O motor gosta de rotação e a caixa deixa bastante margem para desenvolver e fazer pequenos ajustes de acelerador. No modo Sport o escape torna-se uma ajuda essencial para trabalhar na curva final do taquímetro. Embora seja visualmente interessante, o efeito da escala a subir não é facilmente percetível em condução rápida, transferindo para o escape e os ouvidos a responsabilidade de acertar as passagens de caixa. Se o roadster tem uma transmissão desportiva e com toque mecânico, o citadino tem uma caixa pouco precisa e com curso longo. Afinal, a base é um Fiat 500.
Venha o diabo…
A utilização também é muito semelhante. Ambos são demasiado secos para o empedrado da cidade e têm o mesmo número de lugares realmente utilizáveis.
Como compensação perante a maior facilidade em estacionar do 595 Competizione, o 124 Spider é descapotável. É a partir daqui que começam a seguir caminhos distintos. Caminhos que os deixam separados por uns significativos 12 500€. No entanto, o que nos faz não ter grandes dúvidas na escolha do roadster é a tração.
O 595 Competizione é rápido e eficaz, mas não consegue igualar os níveis de envolvimento e diversão do 124 Spider. Mesmo com a eletrónica ligada.
Texto: Ricardo Machado
Fotos: Vasco Estrelado
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