Nenhum dia foi tão terrível na história do automobilismo quanto o 11 de junho de 1955, há 64 anos. No calor da corrida, a 23ª edição das 24 Horas de Le Mans ficaria manchada para sempre pelo gravíssimo acidente que matou 83 espectadores e o piloto francês Pierre Leve. Mais 120 ficaram feridos. Uma corrida para recordar pelos piores motivos.

Num domingo de julho de 1955, mais uma jornada de corridas no circuito de La Sarthe que se engalanou para receber mais de meio milhão de visitas, entre pilotos, staff e fãs ansiosos para acompanhar ao vivo de um novo duelo histórico entre Mercedes, dominadora naquele momento, e a armada britânica da Jaguar, a oposição que contava. A estrela da equipa germana era o mítico Fangio, para muitos o melhor piloto de todos os tempos. Com as cores da Jaguar destacava-se Mike Hawthorn, um jovem de apenas 26 anos já com traços de génio, senhor de um talento incomum e de forte personalidade.

O que não passava para os jornais da época era que estava doente. Gravemente doente. Os médicos não acreditavam que chegasse a completar os 30 anos de idade. E o “Golden Boy”, como carinhosamente lhe chamavam os fãs, não pensava em muito mais do que viver da forma mais intensa possível para as suas três grandes paixões: mulheres, bebida e velocidade.

Nas pistas deixava tudo o que tinha. Inclusive sinais evidentes do estilo de vida… explosivo. E sabia-se que, em competição, poucos se sentiam confortável com a sua atitude temerária ou com a condução praticava. Os acontecimentos em pista acabariam por dar-lhes razão.

Travagem para o caos

Decorridas pouco mais de duas horas de corrida, Hawthorn comandava a luta com Juan Manuel Fangio quando na reta que antecedia a entrada das boxes recebeu sinal da Jaguar para parar e reabastecer. Sem querer dar mais uma volta, ele cortou para a direita logo após a rápida ultrapassagem ao compatriota Lance Macklin e travou… a fundo!

Macklin reage, Pierre Levegh, no outro Mercedes de fábrica, acerta a toda a velocidade na traseira do Austin-Healey de Macklin, para depois levantar voo e embater com estando no muro à frente. O ‘Flecha de Prata’ desintegrou. O eixo dianteiro e o bloco do motor soltaram-se e, com a altíssima velocidade do carro, voaram por metros em direção às arquibancadas. Vários espectadores perderam a vida naquele momento. Outros foram feridos, queimados pelas chamas que se espalharam rapidamente, ateadas pelo facto de a Mercedes recorrer a componentes de magnésio, um metal mais leve, mas altamente inflamável.

Levegh foi cuspido do seu carro, morrendo na sequência do impacto.

Por todo a parte, o cenário dantesco era de um filme de terror. Porém, de forma surreal, a corrida não parou — a organização viria a justificar a sua decisão como uma tentativa de controlar o pânico entre a assistência —, ainda que a Mercedes tenha decidido, posteriormente, retirar todos os seus pilotos da competição, oferecendo a vitória à Jaguar e a Mike Hawthorn, que não se livrou de ser apontado pela imprensa europeia em peso como o responsável pela tragédia.

Hawthorn, porém, sempre negou qualquer culpa: “Na minha opinião, deixei tempo suficiente para qualquer carro que estivesse atrás de mim perceber o que eu ia fazer”. Ainda assim, o piloto chegou a ponderar retirar-se dos traçados — o que não chegou a fazer.

No rescaldo, a Mercedes abandonou os testes a carros até 1989, enquanto Hawthorn deixou o passado para trás, indo em busca de mais vitórias antes que a doença lhe roubasse a vida — algo que viria a conseguir, em 1958, após um duelo impressionante com Stirling Moss, tornando-se o primeiro campeão inglês de F1. O destino voltou a trocar-lhe as voltas. Em janeiro de 1959, Hawthorn perdeu a vida num acidente de viação.

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