Uri Levine: “Não vale a pena criar uma start-up se ela não estiver centrada no utilizador”

29/11/2023

No primeiro dia da Cimeira de Cascais do Portugal Mobi Summit, o confundador do Waze e da Moovit, destacou o papel das start-ups de mobilidade e defendeu a criação de soluções gratuitas de transportes públicos.

O trânsito nas estradas e o tempo de procura por um estacionamento são dois dos problemas mais significativos no domínio da mobilidade. Atualmente, os utilizadores passam, em média, um terço do seu tempo de condução em busca de um lugar para estacionar e, por outro lado, as soluções de transporte público nas cidades tendem a ser insuficientes para os problemas de congestionamentos. As conclusões são avançadas por Uri Levine, cofundador do Waze e autor do livro “Apaixone-se pelo problema, não pela solução”, que falou esta manhã durante a Cimeira de Cascais do Portugal Mobi Summit.

 

O empresário israelita de 58 anos, um dos fundadores da Moovit, entre muitas outras empresas em que está envolvido, começou por falar do trânsito nas grandes metrópoles. “Um problema que se tende a tornar cada vez pior”, diz. Para pensarmos em soluções é necessário juntar o empreendedorismo a mobilidade e focar esta duas dimensões naquilo que é realmente procurado pelos utilizadores no seu dia-a-dia. É assim que se começa uma viagem atribulada, com um problema em mente, para se encontrarem soluções e que se podem então criar start-ups neste mesmo âmbito.

“É como um relacionamento que se começa. Por vezes pode haver a sensação de que não vai resultar e até quem diga que não temos nada em comum com aquela pessoa, mas é suposto que existam altos e baixos e espaço para falhar”, salienta Uri Levine. Desde 2007 que se focou na criação de projetos e start-ups, com o objetivo sempre comum de criar valor a partir do empreendedorismo. “Não vale a pena criar uma start-up se ela não estiver centrada no utilizador”, sintetiza. Mantendo esta máxima, existem ainda dois aspetos sobre o quais qualquer empreendedor deve estar ciente: por um lado, que é uma viagem morosa e de altos e baixos; por outro é que se deve falhar o mais rapidamente possível para se voltar a tentar.

O autor deu exemplos de empresas que demoraram anos a estabelecer a sua ideia original, como a Netflix ou o ChatGPT. No seu caso, abordou a primeira vez em que apresentaram a Waze, em 2007, mas que levou quatro anos até se estabelecer realmente. “Criámos um mapa de Telavive e através da ciência computacional perceber onde é que estavam as zonas de congestionamento e direcionar as pessoas para outras vias”, explica. A procura de investimento e a necessidade de melhorias obrigou-os a repensar o produto que tinham lançado no mercado e que era gratuito. Começou a crescer exponencialmente em 2012 e, no ano seguinte, a Google fez uma proposta de compra. “Saí no dia seguinte para poder criar outras start-ups”, conta Levine.

No caso da Waze, o valor acrescido estava no conhecimento sobre as zonas de maior congestionamento, mas foi a precisão do tempo de chegada que atraiu mais utilizadores, sublinhou ainda o autor. Prosseguiu com as suas ideias sobre mobilidade para chegar à criação do Moovit, focado nos transportes públicos. “O âmago da questão estava em olhar para o desafio do trânsito que está constantemente a aumentar”, sustenta. A partir de uma imagem com uma via composta por cinco faixas de rodagem, Levine explicou o rácio de veículos para o número de pessoas em cada um destes. “Estão muitas vezes ocupados por apenas uma ou duas pessoas”, acrescenta. Aplicações como a Uber vieram ainda dificultar mais o problema.

 

“É aqui que se podem encontrar soluções, nomeadamente a criação vias exclusivas para transportes públicos”, defende. “Com os veículos ocupamos demasiado espaço e se não mudarmos o rácio vamos acabar com mais engarrafamentos”, completa o autor israelita. No seu entender, a conveniência é a prioridade para convencer os utilizadores. Neste sentido, Levine defende não só a criação de faixas para transportes públicos como a gratuitidade dos mesmos. Se forem criadas estas faixas específicas, não serão sequer necessários motoristas. “Há 50 anos até um elevador tinha uma espécie de motorista e hoje isso não acontece. O mesmo está a suceder nestes transportes coletivos”, destaca.

Na sua intervenção, Levine falou ainda da Pumba, start-up que ajudou a fundar, que lida com o problema do estacionamento. “Muitas pessoas vêm-se confrontadas com o pesadelo diário de encontrar estacionamento, especialmente depois de um dia de trabalho quando estão a chegar a casa, e cerca de um terço da condução destas pessoas é à procura desse lugar”, refere. A Pumba surge nesse sentido, para filtrar os lugares disponíveis e rapidamente direcionar os utilizadores para os lugares disponíveis.

Chegados a este momento, o autor de “Apaixone-se pelo problema, não pela solução” sublinha que é preciso ter equipas fortes, com bons líderes e sem medo do fracasso. Defende que se podem criar mais start-ups, desde que se mantenha o utilizador em mente e que se aborde um problema que existe com grande frequência e que afeta realmente o quotidiano das pessoas. Só assim, diz, é possível controlar o destino dos empreendimentos que cada um traz para o mercado e ter sucesso.

Ricardo Ramos Gonçalves

Portugal Mobi Summit