A proposta consta de um relatório do instituto de estudos ecológicos The New Weather Institute e da ONG ambiental “Possible” que defende que a tendência para a indústria automóvel apostar em veículos de maiores dimensões (e, tendencialmente, mais emissores de CO2) é impulsionada por publicidade agressiva.
Em Inglaterra, foi lançada mesma uma campanha apelidada de “Badvertising” (“má publicidade”, numa tradução livre) associada a uma petição que luta pelo fim dos anúncios que alimentam todo o género de produtos que comprometam, de alguma maneira, o esforço pela mitigação das alterações climatéricas, no contexto da emergência climática que vivemos.
ESTA CAMPANHA NÃO VISA APENAS A PUBLICIDADE AUTOMÓVEL. TAMBÉM COLOCA NA MIRA ANÚNCIOS A COMPANHIAS DE AVIAÇÃO E EMPRESAS PETROLÍFERAS.
Relativamente ao universo automóvel, os defensores da campanha “Badvertising” alicerçam-se em números avançados no final de 2019 pela Agência Internacional de Energia (AIE), segundo a qual o grande aumento no número de SUV no Reino Unido e em todo o mundo é o segundo maior fator para o incremento nas emissões globais desde 2010.
Maiores, mais pesados e menos aerodinâmicos
O maior tamanho, maior peso e maior resistência aerodinâmica dos SUV pressupõe que este género de viaturas – que ganhou grande popularidade – consomem mais combustível e emitem mais dióxido de carbono do que os veículos de menor porte, mesmo quando estamos a falar de SUV baseados em modelos de segmento B ou C.
Para o thinktank do New Weather Institute e da organização climática Possible, os fabricantes estão a gastar milhões de euros em anúncios destes veículos, contribuindo para o reforço da sua penetração no mercado.O relatório em causa intitula-se “Upselling Smoke“, algo como “vendendo fumo”.
O relatório diz que a tendência global de aumentar as vendas de SUV maiores e mais poluentes está a prejudicar as metas climáticas.
Globalmente, estima-se que haja mais de 200 milhões de SUV, um aumento de 35 milhões face a 2010, representando 60% do acréscimo da frota mundial de automóveis desde 2010.
Este grupo thinktank pede uma proibição de publicidade, à semelhança do que sucedeu com o tabaco, para automóveis com emissões médias de CO2 de mais de 160 g de CO2/km, bem como para todos os automóveis com mais de 4,80 metros de comprimento. Segundo o documento, isso abrangeria o terço dos veículos mais poluidores comercializados no Reino Unido.
AS MARCAS DEFENDEM-SE REFERINDO QUE OS MODERNOS SUV SÃO OS MAIS LIMPOS DE SEMPRE, SUBLINHANDO QUE MUITOS TÊM UMA COMPONENTE DE ELETRIFICAÇÃO, NALGUNS CASOS COMO HÍBRIDOS PLUG-IN.
Andrew Simms, co-diretor do New Weather Institute, faz, de resto, uma analogia com o tabaco: “Acabamos com a publicidade ao tabaco quando compreendemos a ameaça que era fumar para a saúde pública”.
Simms prossegue o raciocínio: “Agora que estamos a par dos danos infligidos à saúde humana e ao clima pela poluição automóvel, é hora de parar com os anúncios que agravam o problema. Num mundo propenso a pandemias, as pessoas precisam de ar limpo e de mais espaço nas ruas da cidade”.
A campanha inglesa refere ainda que os grandes SUV são também um meio de transporte menos racional e eficiente para a mobilidade urbana, dado o seu tamanho. Apontam os ambientalistas que, no ano passado, mais de 150 mil veículos novos que foram vendidos no Reino Unido tinham mais de 4,80 metros de comprimento, o que significa até que são grandes demais para caber num lugar de estacionamento mais comum.
Pub direcionada para carros mais eco
Em abril de 2018, a T&E acusava os fabricantes de estarem a retardar o lançamento de novos veículos “plug-in” e elétricos, devido à aposta das marcas em SUV: “O aumento das vendas de utilitários desportivos (SUV) e o aumento de potência dos motores estão a resultar no aumento de emissões”, apontava, na altura, a associação Zero.
Os promotores da campanha “Upselling Smoke” dizem que terminar com a publicidade a veículos com uma maior pegada de carbono forçaria igualmente os fabricantes a concentrar os seus orçamentos publicitários em veículos mais pequenos e com menor consumo de combustível, para além de versões totalmente elétricas de modelos mais evoluídos.
Também o Centro de Pesquisa de Energia do Reino Unido (UK Energy Research Centre) entende que o cumprimento dos compromissos climáticos do Reino Unido implica ações imediatas para combater o rápido aumento nas vendas de carros de maiores dimensões.
Portugal: 3 em cada 10 veículos novos são SUV
No Reino Unido, onde esta discussão foi lançada, os SUV representam mais de 40% das matrículas novas – enquanto os veículos totalmente elétricos representam menos de 2%. Por cá, os dados da Associação Automóvel de Portugal (ACAP), mostram que os SUV têm ganho um peso crescente ao longo dos anos, valendo 29% (dados de 2019). Ou seja, três em cada dez novos veículos comprados em Portugal são SUV. As estatísticas da ACAP evidenciam ainda que a preferência dos portugueses recai nos SUV 4×2 (27%), havendo apenas 2% de SUV com tração integral. Na Europa, a quota de mercado dos SUV aumentou de 4% em 2001 para 26% em 2016.