Estacionar em Lisboa é cada vez mais Missão: Impossível…

10/03/2018

Ao cabo da sétima viagem ‘circular’ pelas mesmas ruas junto ao Saldanha em busca de um lugar, atravessa-se pelo meu cérebro a ideia de ‘entrar numa’ de Michael Douglas no filme ‘Um Dia de Raiva’ e desatar a ‘escavacar’ o carro à paulada num sítio qualquer, tal era a saturação da viagem.

Nem era preciso muito… Podia ser mesmo no meio da via, que, assim como assim, ficava logo o caso resolvido. Afinal de contas, perdi cerca de 30 minutos numa manhã de sábado para encontrar um mísero lugar que não tivesse um sinal de proibido ou uma porta de garagem.

Não o fiz porque a lucidez e a racionalidade imperaram, obviamente. Reina, felizmente, a consciência. E, depois, porque os senhores da Nissan eram capazes de não achar muita piada a um acesso de fúria no meio da cidade de Lisboa. Mas, é mesmo isso. O estacionamento é uma loucura, exasperação e uma missão impossível. Enquanto se embarca na toada algo populista da extração do automóvel de dentro da cidade, alargam-se passeios e suprimem-se faixas de circulação e, pior, estacionamentos. É certo que poderia ter ido de transportes públicos, mas a) não quis e, b) transportar objetos pesados no autocarro ou metro não é propriamente fácil…

Dica: Nunca queiram seguir os conselhos de Michael Douglas no trânsito

Ora, obviamente que é importante tirar carros do centro da cidade. Mas, convém que seja dito que o atual sistema de transportes públicos não funciona. De metropolitano, ir da estação de Amadora Este até ao Aeroporto leva, se tudo correr otimamente bem – entre 45 minutos a uma hora. Depois, claro, há sempre os inevitáveis atrasos, as perturbações que se tornam corriqueiras e que, às tantas, já ninguém liga. Exceto quando se quer mesmo estar a apanhar o avião e no painel informativo do metro aparece uma indicação de que o próximo comboio tarda 12 minutos…

O exemplo de Genebra

Recentemente, estive em Genebra para o Salão Automóvel. Aí, o sistema de transportes públicos funciona eximiamente. Nunca esperei mais de três minutos para apanhar um autocarro e seguir caminho. E, ainda assim, havia carros na cidade. Claro que havia carros. As pessoas têm a liberdade de poder escolher o meio que mais lhes convém. E se é de carro, vão querer usar o seu carro. Falamos de Genebra, na Suíça, recorde-se.

Seja como for, o automobilista vê-se encurralado. Com alguma razão. Durante anos, ao automobilista foi dado o direito de poder circular com o seu carro, uma liberdade de movimentos que agora, se lhe quer tirar. É, por isso, natural que o automobilista se sinta ameaçado, acossado. E nesta fúria sem quartel contra o automóvel e contra os automobilistas, dá-se primazia aos meios chamados ‘suaves’. O que é ótimo. Não fosse o facto de não servir para todos. Por exemplo, se eu quiser ir de casa para o trabalho de bicicleta, precisaria de levar umas quantas embalagens de toalhetes para tomar banho ‘à gato’. Agora, imaginem uma empresa em que os 15 ou 20 trabalhadores de um mesmo piso exalam a molho ‘pesto‘ no verão.

Pense-se no estacionamento não como um problema, mas como uma solução. Uma grande parte dos problemas de mobilidade no interior das cidades prende-se com o facto de não haver estacionamento. Dão-se três, quatro voltas aos mesmos locais, aumentando a poluição, o consumo de combustível e o tempo perdido. Enfim, eficiência total abaixo de zero. A mais recente tendência é, até, de tirar estacionamento aos automóveis para colocar plataformas de bicicletas no seu lugar quando o passeio ao lado tem metros livres. Nada contra as bicicletas e para o mais recente sistema de partilha das duas rodas. Mas convém que se tenha o discernimento de não ser um Robin Hood da mobilidade urbana: tirar a uns para dar a outros. Porque não dar aos dois? Porquê tirar lugares de estacionamento para lá colocar plataformas de bicicletas partilhadas quando ao lado existe espaço no passeio para o fazer?

Nesta cruzada, temo que a batalha do automobilista esteja perdida. Mobilidade não é querer à força implementar o sistema que se acha mais eficaz. É resolver os problemas que estão à vista de todos. E, às vezes, o pior cego é mesmo aquele que não quer ver.