Popularizaram-se pela sigla de TGV os comboios de alta velocidade que combinam luxo com velocidade pura. Uma obra de engenharia que encontra cada vez maior paralelismo no setor automóvel. Olhe-se para o espetacular Mercedes-AMG GT de quatro portas que tivemos a oportunidade de ensaiar recentemente – tempos pré-Covid-19 -, numa combinação de estatuto, velocidade e conforto. E sem esquecer que também é eficiente graças à estratégia de eletrificação EQ Boost.

A Mercedes-AMG tinha na sua gama GT a joia da coroa: um modelo coupé de duas portas criado em formato superdesportivo que também já passou pelo Motor24. Puramente sensorial. Mas a marca alemã sediada em Affalterbach observou a forma como a Porsche tem sido bem-sucedida com o seu Panamera mais desportivo, o Turbo S E-Hybrid, e lançou mãos à obra na criação de um coupé de quatro portas, inspirado fortemente no seu ‘irmão’ de duas portas, mas com uma dose maior de conforto e de requinte a bordo. Também com um pouco menos de potência e algo mais filtrado. Mas já lá iremos.

A técnica por detrás deste modelo é significativa, surgindo esta versão intermédia com um motor de seis cilindros em linha – um arrojo – com 3.0 litros de cilindrada e sobrealimentado. Aqui, com a particularidade de unir um turbocompressor tradicional a um compressor elétrico, possibilitado pela rede elétrica de 48 V que lhe concede o estatuto de mild-hybrid. A potência combinada é de 435 CV a que se juntam ainda os 22 CV do motor elétrico que serve essencialmente como auxiliar de performance. Em caso de necessidade, ao pressionar o acelerador a fundo, todo o potencial conjunto é libertado. As respostas do conjunto são deveras entusiasmantes, sobretudo no sentido em que este AMG não é propriamente pequeno – mais de cinco metros de comprimento e mais de duas toneladas de peso.

Mas a forma como está afinado engana o condutor, pois combina agilidade com destreza de movimentos na transferência de massa em curva e a suspensão pneumática variável (AMG Ride+ por 2350€) faz um trabalho fantástico nesse capítulo. O AMG GT de quatro portas entra em curva alinhado, com frente incisiva e trajetória ‘limpas’ e rápidas, fazendo até esquecer que temos 435 CV sob o pé direito. É bastante eficaz e isso entusiasma. Talvez por isso, o capital de confiança que oferece é bastante amplo, não se coibindo, porém, de começar a demonstrar maior nervosismo quanto maior é a temeridade do condutor.

A tração integral 4MATIC+ otimizada para fins desportivos é exímia e, apenas nos dois modos de condução mais excêntricos – Sport+ e Race – o AMG GT 53 permite extrair todo o seu potencial. Aqui, há mais nervo. A gestão eletrónica dos controlos de estabilidade e de tração AMG Dynamics tornam-se mais liberais ou ausentes, a suspensão fica mais firme e o binómio motor/caixa ganha atuação ainda mais acutilante. A sonoridade emanada dos escapes acompanha a escalada na performance, com uma banda sonora que, se não é tão forte como a do V6 biturbo, não esconde o seu ‘pedigree’ desportivo.

A aceleração, que é poderosa, leva-nos dos zero aos 100 km/h em 4,5 segundos, sendo preciso ainda destacar a impetuosidade das recuperações, sem qualquer noção de ‘lag’ na resposta. O mérito é do compressor elétrico, que permite suprimir o tempo de atraso na resposta de um turbocompressor convencional, em associação aos 22 CV do motor elétrico e dos 250 Nm que este proporciona. Os 520 Nm de binário máximo são extremamente bem aproveitados pela caixa de velocidades AMG Speedshift de nove relações, com patilhas atrás do volante e as quais devem ser utilizadas para um maior prazer de condução.

Essencial, porém, é a inclusão do Pack AMG Dynamic Plus (opcional por 4000€), que acrescenta diferencial autoblocante traseiro, discos de travão de maiores dimensões com pinças pintadas a amarelo e os modos de condução ‘Race’ e ‘Drift’, este último preferível de utilizar apenas em circuito ou ambientes controlados, atendendo a que a potência passa a ser transmitida apenas ao eixo traseiro.

Mas, se já falámos de um motor elétrico e de uma rede de 48 volts, poder-se-á pensar que estamos na presença de um ecodesportivo? Nem por isso… No caso dos AMG, a estratégia EQ Boost serve, antes de mais, como atributo de prestações, o que faz com que a máquina elétrica presente assuma algumas funções de alternador/gerador e motor de arranque, como a de gestão do sistema de start-stop (suavidade garantida). Dessa forma, os consumos dificilmente se situam abaixo dos 10 litros por cada 100 km. No nosso ensaio, obtivemos uma média de 12,4 l/100 km, naquele que é o preço a pagar pelas prestações de luxo desportivo.

Por outro lado, prefiram-se toadas mais pacatas e este revela-se cómodo e robusto, com rolamento confortável na maior parte dos pisos.

Qualidade referencial

A bordo, a qualidade de construção é referencial, com o AMG GT de quatro portas a recorrer a revestimentos em pele para tablier, portas e bancos, combinando dessa forma refinamento e desportividade. Na parte inferior do habitáculo, nota para a camada também suave. A posição de condução é brilhante e o ‘abraço’ dos bancos desportivos AMG acomoda o corpo da maneira desejada. O volante, também ele desportivo, recupera a solução já encontrada noutros AMG, de botões dedicados como o do AMG Dynamic Select ou os do controlo de estabilidade e da sonoridade dos escapes. Um centro de comando no próprio volante, o que é útil porque o avantajado túnel central nem sempre é de fácil acesso, sobretudo com alguns botões espalhados e o próprio seletor de condução (ou da caixa, como se preferir) colocado em posição recuada.

Porém, ponto essencial neste modelo é o facto de dispor de duas portas atrás e, se o acesso aos mesmos não é brilhante, sobretudo na passagem dos pés, permitem uma maior polivalência familiar, mesmo que os lugares posteriores sejam mais amplos para as pernas do que em altura do assento ao tejadilho. A possibilidade de um terceiro passageiro atrás está dependente da aquisição de um opcional lugar central por 850 euros…

Tecnologicamente, o grande destaque vai para a combinação dedois ecrãs ‘widescreen’ e possibilidades diversas de personalização, a que se junta um sistema de telemetria ‘Track Pace’ (de série) que permite analisar os tempos por volta em circuitos pré-carregados (que podem ser ampliados em número) ou a análise dos diferentes aspetos do veículo em condução desportiva. O sistema Comand Online de conectividade também está presente com ‘pad’ tátil entre os bancos. Único lamento durante a condução para a visibilidade mais limitada, sobretudo do lugar do condutor pelo óculo traseiro, que sendo estreito não ajuda muito nas manobras.

Deixando a estética para o final, a agressividade da versão de base é reforçada pela escolha do Pack Aerodinâmico AMG, com splitter dianteiro e asa fixa (ajustável manualmente) em preto brilhante (por 3550€). Seja como for, uma silhueta elegante à qual a pintura designo cinzento selenite magno (3500€) confere uma aura mais misteriosa.

E quanto é que a Mercedes-AMG ‘pede’ por este conjunto desportivo? Justos 132.500€, com uma série de elementos de série que são já interessantes, como o já referido sistema AMG Track Pace, o Cockpit Panorâmico, o sistema Comand Online, o sistema de escape AMG Performance e embaladeiras das portas iluminadas, entre outros. Mas, para se desfrutar deste coupé de quatro portas em toda a sua glória é preciso ser-se um pouco mais generoso com a escolha de packs: a unidade ensaiada contava com a adição de Pack Aerodinâmico AMG (3550€), Pack Night Exterior AMG com vidros traseiros escurecidos (650€), Pack AMG Dynamic Plus (4000€) com diferencial traseiro autoblocante, suspensão AMG Ride Control+, pinças dos travões de cor Amarela e botões AMG no volante, além do Pack Premium (5750€), com assistente de ângulo morto, pack Memórias, câmara 360º, sistema de som Burmester e carregamento wireless para smartphone. Juntem-se ainda as jantes escurecidas de 20 polegadas em pack (2000€) e os discos de travão em cerâmica (8600€) e temos uma bem mais exclusiva conta de 169.424€.

VEREDICTO

No segmento dos desportivos de luxo, o GT de quatro portas representa uma entrada em cheio da Mercedes-AMG, aproveitando muito do capital de imagem obtido com o coupé de duas portas. Num patamar intermédio de gama – no topo há a excelsa motorização 63 S com 639 CV – este GT 53 tem tudo o que se pode esperar, destacando-se um motor com energia e músculo para desbravar caminho em animada sintonia com a eficácia de um chassis que é fruto de um aturado trabalho de desenvolvimento da marca e que equilibra eficácia e refinamento numa medida adequada. Talvez seja por aqui que este Mercedes-AMG GT de quatro portas mereça a sua melhor apreciação, atendendo a uma agilidade que surpreende o condutor, que espera reações talvez mais lentas e maior desequilíbrio atendendo às dimensões. Nada disso. Tudo rigoroso e certeiro.

Enfim, o preço base adequa-se ao que é proposto, mas se se entrar pela definição dos opcionais, tende-se a aumentar em demasia a fatura. O que é um pecadilho de relativa importância neste segmento.

CARACTERÍSTICAS TÉCNICAS
Mercedes-AMG GT 53 4MATIC+ 4P Coupé
Motor: Gasolina, 2999 cc, seis cilindros em linha, injeção direta, turbo, compressor elétrico e intercooler
Potência: 435 CV às 6100 rpm
Binário: 520 Nm entre as 1800-5800 rpm
Transmissão: Caixa automática AMG Speedhisft de nove velocidades; tração integral 4MATIC+
Acel. 0 aos 100 km/h: 4,5 s
Velocidade máxima: 285 km/h
Consumo médio (WLTP): 10,1 l/100 km
Emissões CO2 (WLTP): 231 g/km
Comp/Lar/Alt: 5054/1953/1455 mm
Distância entre eixos: 2951 mm
Peso: 2045 kg
Bagageira: 456 litros
Pneus: 265/40 ZR20 (f) – 295/35 ZR20 (t)
Preço da gama AMG GT 53: 132.500€
Preço da versão ensaiada: 169.424€

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