Manifesto enviado a partidos: propostas para a sustentabilidade do país

29/01/2024

A associação Zero elaborou um “Manifesto para as Legislativas 2024”, com propostas que promovam a transição do país para a sustentabilidade.

 

A conjuntura internacional, com diversos conflitos armados sem fim à vista e um reforço do discurso extremado e fraturante, apela à necessidade de agir no sentido de construir uma sociedade que não deixe ninguém para trás, que promova a coesão social em pleno respeito pelos limites do planeta, visto que nunca poderá haver prosperidade se a base ambiental for descurada: esta é a introdução que a ambientalista Zero – Associação Sistema Terrestre Sustentável faz para contextualizar o lançamento de um “Manifesto para as Legislativas de 2024”.

Como superar os desafios ambientais?
A associação Zero destaca no manifesto que “é precisa uma compreensão mais profunda das interligações entre ambiente e o bem-estar social e económico de uma sociedade. Quando se observa um reforço do olhar para o ambiente como um “empecilho”, torna-se fundamental demonstrar que o problema é exatamente o oposto: se não cuidarmos da nossa base de existência a prosperidade social e económica será, cada vez, uma realidade longínqua”. A associação defende ainda como sendo “fundamental um foco muito mais intenso nas interconexões entre políticas no sentido de lhes dar coerência”. Na visão da Zero, “é imperativo que a alocação de recursos e o estabelecimento de objetivos concretizem a mudança necessária rumo a uma Economia do Bem-Estar, promotora da biodiversidade, eficiente no uso de recursos e neutra em emissões em 2040”.

O documento, tornado público, tem por base um conjunto de propostas com o objetivo de promover a transição do país para a sustentabilidade e torná-la uma prioridade estruturante das políticas públicas.

“Como resposta à mudança que a sociedade exige”, como escreve a Zero, o manifesto apresenta propostas transversais, aplicáveis às diferentes áreas da governação, seguidas de propostas em 11 áreas temáticas específicas, sempre com uma perspetiva de transição para a sustentabilidade.

A Zero salienta que “tem todo o interesse e disponibilidade para debater com os partidos”, a quem este manifesto já foi enviado, com a associação a considerar este “o melhor caminho para tornar exequível a aplicação das medidas propostas em Portugal no curto/médio prazo”.

TORNAR A SUSTENTABILIDADE DE PORTUGAL O ELEMENTO ESTRUTURANTE DAS POLÍTICAS PÚBLICAS É O DESAFIO LANÇADO AOS PARTIDOS POLÍTICOS NO MANIFESTO QUE LHES FOI ENTREGUE.

De forma mais sumária, estas são as diferentes propostas do Manifesto:

O que diz o Manifesto sobre energia e alterações climáticas

  • Concluir uma revisão ambiciosa do Plano Nacional de Energia e Clima e demais planos e ações previstas na Lei de Bases do Clima.
  • Dar prioridade à elaboração da Estratégia Nacional para o armazenamento de energia à eletrificação de veículos rodoviários com elevadas taxas de utilização.
  • Implementar a Estratégia Nacional de Longo Prazo para o Combate à Pobreza Energética (ELPPE) 2023-2050.

Transportes

  • Revisão do Plano Estratégico de Transportes à luz do Plano Nacional de Energia e Clima e do Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2045.
  • Concluir a Avaliação Ambiental Estratégica do Plano Ferroviário Nacional, dando prioridade aos investimentos com maior potencial de redução do impacte ambiental.
  • Aumento das restrições de estacionamento no interior das grandes cidades.
  • Aceleração da conversão de frotas de transporte público rodoviário para modo elétrico – estabelecimento de metas de introdução de veículos elétricos por operador.
  • Concretizar a opção estratégica relativamente ao novo aeroporto de Lisboa que tenha menor impacto ambiental a nível local, garantir que ela se integra plenamente nas redes ferroviárias de escala metropolitana, nacional e europeia e que responde de forma adequada a uma procura compatível com a resposta à crise climática.
  • Integrar os modos leves nos sistemas de passes.

Ordenamento do Território

  • Garantir o respeito pelo cumprimento dos Planos Diretores Municipais.
  • Inverter a desclassificação sistemática de áreas essenciais para a redução de diversos riscos nas áreas classificadas como Reserva Ecológica Nacional e dos solos mais produtivos classificados como Reserva Agrícola Nacional.
  • Definir, a nível superior, zonas non aedificandi em áreas identificadas como vulneráveis às alterações climáticas, nomeadamente em zonas costeiras, avaliando ainda a possibilidade de introdução de um mecanismo legislativo que permita a revogação de direitos adquiridos (mediante compensações) com base na alteração de circunstâncias.

Ambiente Urbano

  • Garantir o cumprimento da legislação da qualidade do ar em todas as cidades portuguesas que atualmente apresentam situações de excedências que põem em causa a saúde das populações.
  • Desenvolver uma Estratégia Nacional para o Ruído e garantir o integral cumprimento da legislação do ruído (nomeadamente a elaboração de mapas de ruído e de planos de redução quando necessários).

Economia Circular

  • Promoção alargada da compostagem doméstica e comunitária de biorresíduos.
  • Repercussão sobre as embalagens de plástico colocadas no mercado português da taxa definida a nível europeu (0,80€ por quilograma ou 800,00€ por tonelada) sobre as embalagens de plástico não recicladas em cada país.
  • Garantir a publicação urgente da Portaria de enquadramento do sistema de depósito para embalagens de bebidas descartáveis.
  • Apoiar os municípios que queiram lançar projetos de prevenção da produção de resíduos na área dos têxteis, equipamentos elétricos e eletrónicos e do mobiliário e objetos afins.
  • Rever os princípios subjacentes à aplicação da responsabilidade alargada do produtor na área dos resíduos no sentido de: integrar a obrigação de promoção da reutilização e ou reparação.
  • Publicação da legislação sobre prevenção e remediação da poluição do solo (ProSolos).

Água e Oceano

  • Rever e implementar, com caráter de urgência, o Programa Nacional para o Uso Eficiente da Água (PNEUA 2020).
  • Reforçar a capacidade de controlo da utilização de águas subterrâneas.
  • Implementar medidas que fomentem a reutilização de água com qualidade ajustada aos diferentes usos, sobretudo para uso em meio urbano.
  • Estabelecimento de uma moratória imediata nos investimentos no regadio para efetuar uma avaliação ambiental estratégica.
  • Garantir a aplicação do princípio da precaução, implementando uma moratória à mineração em mar profundo aplicável a toda a Zona Económica Exclusiva e plataforma continental estendida.

Conservação da Natureza

  • Conceção e implementação de um modelo de pagamento de serviços de ecossistema para os proprietários detentores de parcelas e atividades promotoras de conservação ativa de espécies e habitats protegidos, bem como de serviços ambientais à sociedade, localizados em Áreas Classificadas.
  • Alargamento e definição de novas áreas classificadas.
  • Abrir uma consulta pública para Revisão do Regime Jurídico da Conservação da Natureza e da Biodiversidade.

Agricultura

  • Revogar a Resolução do Conselho de Ministros n.º 206-A/2023, de 29 de dezembro, que prorroga o Programa Nacional de Regadios até 2028, comprometendo mais investimento público sem que tenha sido feita qualquer avaliação de impacte ambiental do programa.
  • Proibir o uso de sementes transgénicas e outras formas de apropriação do património natural vivo.
  • Remoção progressiva dos apoios públicos à agricultura com alto nível de inputs, baseada em cadeias agroalimentares longas e geradoras de externalidades negativas.
  • Reativar os observatórios e campos experimentais agrícolas públicos em áreas relevantes.

Floresta

  • Dar continuidade à programação de investimentos que permitam efetivamente alterar o paradigma de investimento em minifúndio que garanta a conversão da paisagem com investimento em espécies autóctones.
  • Equacionar a possibilidade de instituição de modelos de financiamento misto (investimento público combinado com investimento privado) em que o apoio público parcialmente assenta no pagamento por resultados.
  • Manter a atual política de limitação ao incremento da área ocupada por espécies de rápido crescimento, melhorando o mecanismo de compensação previsto na legislação para que, com apoio público e até 2030, se registe uma reconversão dos 100 mil hectares de povoamentos de espécies de Eucaliptus spp. inseridos em áreas classificadas, através da rearborização com espécies autóctones.

União Europeia

  • Que Portugal assuma uma postura proativa e interventiva, no sentido de procurar que a União Europeia mantenha a sua liderança mundial em termos de sustentabilidade.
  • Apoiar a necessidade de adotar uma fiscalidade sobre o sector da aviação.
  • As relações comerciais da União Europeia (UE) com os seus parceiros devem ter como prioridade o interesse público e o contributo para o cumprimento dos compromissos assumidos a nível internacional na área da sustentabilidade.
  • Defender que a UE dê passos decisivos em direção aos objetivos de uma sociedade sem tóxicos e com poluição zero.

Questões transversais que a Zero defende o seu Manifesto

► Acelerar a transição para um novo modelo económico compatível com os limites planetários, que são o garante da existência da espécie humana. Desde logo através da promoção de um debate nacional sobre como pode Portugal tornar-se uma Economia do Bem-Estar – assente na ideia que a Economia deve estar ao serviço das pessoas e das comunidades.
► Assegurar o cumprimento do objetivo da neutralidade climática em 2045 ou mesmo antes, em linha com o previsto na Lei de Bases do Clima Portuguesa. Efetuar uma transição energética mais rápida, justa e sustentável para uma energia 100% renovável até 2040. É essencial que toda a nossa eletricidade seja proveniente de fontes de energia renováveis até 2035.
► Avaliar o impacto no ambiente/sustentabilidade das políticas definidas, através da criação de uma unidade de análise de políticas que permita informar os decisores sobre os custos e benefícios sociais, económicos e ambientais de diferentes projetos de infraestruturas, legislação e políticas.
► Assegurar a plena aplicação da legislação e da regulamentação.
► Melhorar a quantidade e qualidade dos dados disponibilizados pela Administração.
Credibilizar a intervenção das instituições públicas que devem ser o garante da defesa do bem-comum.

Documento completo de 22 páginas do “Manifesto Zero para as Eleições Legislativas de 2024” está disponível aqui.