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Peugeot 604, o conforto à moda francesa

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O clássico de hoje é tudo menos excêntrico. Fonte de grandes alegrias, os clássicos são sem a menor dúvida parte da nossa vida. Para mim, viver o espírito dos clássicos é um eterno interpretar de visões. Se umas foram bem conseguidas, outras nem tanto. A meu ver, cada automóvel, clássico ou não, foi resultado de uma necessidade. Possivelmente longe de saciar a eterna procura pelo perfeito, ou de satisfazer os desejos de uma sociedade exigente, cada clássico representa uma aposta. Tal como num tradicional jogo de roleta, cada apostador deposita o seu dinheiro na esperança de um retorno financeiro. Assim funciona o mercado automóvel, cheio de sucessos e fracassos, e muitos clássicos contam essa história, mas só para quem a quer ouvir.

Amada por muitos, ignorada por outros, a Peugeot foi responsável por uma tradição bastante sólida de robustez e conforto. A história da marca que se reinventou década após década e continua o seu rumo repleta de patriotismo e história.

Após os primeiros anos de carência económica do pós Segunda Guerra Mundial, em que os automóveis de luxo eram pouco procurados, a direcção da marca francesa aventurou-se num mercado muito competitivo, determinada a terminar à hegemonia alemã no segmento executivo.

Sendo que a Peugeot não oferecia um competidor aos automóveis alemães, como o BMW Série 5 e Mercedes-Benz 300, a marca francesa apostou forte num automóvel sólido, seguro e numa experiência de condução única no mercado. O Peugeot 604 foi a aposta sóbria de uma marca tida pelo público como a ideal para desenvolver classe sobre rodas, e assim oferecer o tão aguardado modelo executivo.


Apresentado no Salão Automóvel de Genebra de 1975, este modelo prezava pela sua elegância e linhas delicadas. O estilo conservador não foi factor abonatório deste, apesar de ter sido desenvolvido pela conceituada casa Pininfarina. Possivelmente a inovação e audácia deste automóvel fosse aquém do esperado para uma entrada triunfal na mesa dos gigantes. Facto é, que o design interior e exterior foram a fonte de maior critica a este clássico, que tanta tinta fez escrever nas revistas da especialidade. Inúmeras reviews elevaram este automóvel a um estatuto digno do seu valor. Grandes revistas líderes nos mercados alvo do Peugeot como Motor, Car, What Car? e Classic & Sportscar realizaram inúmeros testes e comparações.

Num segmento que contava também com a concorrência de marcas como a Lancia, a Ford e a Rover, o Peugeot cumpriu com distinção nos testes de conforto, qualidade e com menção honrosa para a sua direcção. Os críticos não se contiveram quando chegou a hora de elogiar o carro que sem trazer inovação, maravilhou com a sua classe subtil e conforto exuberante. Todos os cuidados da fabricante asseguraram um automóvel capaz de proporcionar uma viagem silenciosa e sem sobressaltos. Para isso contribuíram a excelência dos materiais utilizados, bem como a nobreza dos acabamentos interiores.

A Peugeot não se poupou a esforços para fazer deste automóvel um equilíbrio perfeito entre adrenalina e tranquilidade. Pese embora não almejasse um carro de corrida, a primeira versão apresentada ao público, a SL, vinha equipada com um motor V6 de 136 cv de potência a gasolina. A potência era transmitida às rodas traseiras por uma caixa de quatro velocidades. A suspensão independente às quatro rodas e barras de anti-aproximação de série conferiam uma qualidade de condução excelente em regimes elevados, bem como uma absorção das irregularidades inigualável no segmento. Os travões de disco às quatro rodas conferiam um poder de travagem acima da média, sendo accionados por servofreio e circuito duplo.

Possivelmente o culminar de anos de trabalho árduo não foi suficiente para o 604, sendo que o mercado nunca reconheceu o verdadeiro valor do Peugeot 604, o que levou ao seu esquecimento gradual enquanto símbolo de elegância, classe e grande qualidade. A sua produção não deixou descendente directo, e ironicamente foi o fantástico cavalo de batalha chamado Peugeot 504 que salvou o 604 da ruína económica. O custo elevado de aquisição de cada 604, estando mesmo acima do BMW Serie 5, foi compensado pela mestria da Peugeot em integrar muitos componentes do 504 na construção do Peugeot 604.

Aparentemente, a excelência carece de algo mais que realmente capte a atenção do comprador. O próprio CX da irmã Citroën foi um sucesso, provavelmente ainda vivendo do legado do magnifico DS. O caminho do Peugeot 604 em direcção ao esquecimento foi inglório. Um dos maiores expoentes do conforto à francesa fica para a história como um falhanço no objectivo magno de oferecer uma concorrência solida aos executivos alemães. Para mim, enquanto automóvel, foi um sucesso inquestionável. O 604 foi uma das pedras que fizeram o caminho da PSA, e provaram ao mundo a determinação de uma marca que passadas quatro décadas ainda representa confiança, solidez e acima de tudo, un Confort à la française!